Oferenda


Ofereço a você, leitor, tudo aquilo que não sou!

Minha poesia medíocre, minha consciência torpe e meu papel desfocado nesse mundo cão.

Ofereço versos ocos, vazios, sem rimas. Ofereço a falta de ar, o descomeço, o desterro.

Ofereço horas e horas desse vento que insiste em acariciar o que já não sabe receber carícias.

Tenham de bom grado todo o mal gosto, a amargura vomitada, suada, posta pra fora, pra voltar o expulsor a ser doce. Não me ouçam, não me vejam. Não sou eu quem estou aqui. Eu fui ali e volto já. Num já sem tempo, sem hora pra chegar, mas volto já.

Caro leitor, tenha em conta que ofereço o melhor do que tenho recebido. Dê-se conta de que não existo, de que é tudo abstração, de que é tudo mentira malvada e brincadeira inocente.

Ofereço pois minha maldade e minha inocência no mesmo suor, esse que lava meus lençóis, meu corpo, meus olhos. Estes então suam e suam e transpiram e todos acham que choram... não. Eles suam o calor das pancadas que recebem. Não há mais tempo pra jogos nesse salão sem música.

Já não há estômago, depois de tanto vomitar, pra achar nesse malgrado, excessivo e fétido mundo de mentiras e covardia, paciência e romantismo.

Então, caro leitor, aceite meus versos que não são meus e que nem versos são, sem rima e sem sentimento. Aceite todo o vazio que me preenche e que chama conteúdo pra me esvaziar de mim e de tanto humor tosco.

Ofereço, por fim, a breguisse e a baixeza. A covardia e a beleza de desfazer os mitos que o mundo imprime em nós. Festejo e felicito esse aceite, diante de todas as negativas feitas às oferendas que poderiam afagar algum espírito. Festejo e felicito pois é o que existe de mais óbvio e acessível no mundo. Apreciem, leitores, vossa própria torpeza e regozigem-se nelas. É o romantismo que nos apetece, a nós, vãos, meros, simples, passageiros... passageiros desequilibrados sobre asas descompassadas que teimam em por abaixo tudo que se aproximar.

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