Desempaciência


Nem doido, nem louco, nem ousando não estar! Nem aqui estou, nem eu mesma sou. Não posso por isso permitir que esteja eu de alguma maneira doada, universalmente transpassada, atravessada, atravancada por qualquer transcendência efêmera que possa postar-se de forma unânime sobre meus desejos. Nem palavras, só ouvidos. Nem eu, vazio. Nem tu, nem nós, nem ninguém. Vozes, voz, e tu me falas mas não me vês. Palavras sobre o mundo, em voltas a tudo que não está. Palavras soltas não me prendem. Palavras escassas, esparsas, ex-atas. Desatada, desastrada, desamada, destratada. De mim não sai nem entra nada, nesse cotidiano sórdido e encrustado de mim mesma, as paisagens são manchadas com uma memória nodal desastrosa na qual impera o sal e a pimenta, os temperos cálidos, áridos, afrodisíacos de meu escárnio. Sórdido mau-humor instantâneo que em poucos momentos se transforma em nada mais. Nada mais daquilo tudo que não acontece, não se mostra e nem se vê. Nada disso, nada daquilo, nada e ninguém, todos juntos como os fantasmas da infância, que não insistem mas sempre estão ali. Seca, objetiva, sem voltas... sem volta, torna seco o objetivo. E de seco nada sente, só racha e esfarela. E seco, cerro meus dentes e avanço sem pudores. Rasgo peles, quebro ossos, debeloto cabeças na ira que trago em mim. Vejo seus rostos e sou fera, descontrolando-me contra toda a ausência descabida que surge como fumaça de ponta que aparece já sumindo. Suma então o mundo inteiro que não quero sequer seu cheiro que não me enche o peito, que me traz toda a ser nariz mas se vira em vento indo embora sem nem paisagem.

Cheia, estafada, cansada, atordida. Desempaciente. Sem ar e cheia de ar!

Stéphanie Moreira

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