Intimidade

Se encontraram como protagonistas de um casamento arranjado, tramado por uma antiga reza mandingueira que dizia de um amor feito doce de melancia, mais doce que cocada, feito beijo de amor que só se dá de madrugada. Cada qual na sua esquina rezou com a boca já adoçada, pedindo ao mundo um amor capaz de fechar sete chagas. Ele nos mói, mas é o mesmo que nos sara. Não sabiam que rezavam cada um de um lado da mesma Encruzilhada.
Lhes deram sete dias para se conhecer e se casar caso percebessem que o outro e a outra era aquele tal pote de doce, ou de ouro, com a condição de deixar ir logo em seguida.
Cientes do caminho acharam cura e rumo, seguiram sãos em acreditar que ainda eram capazes de imaginar outro jeito de portar o coração dentro do peito, sem que estivesse desajeitado, inadequado, tolhido ou partido. Já moravam juntos pois se viam um ao lado do outro e tramavam o cotidiano à distância. Decoravam uma casa imaginária, faziam planejamento de sucessão construindo heranças de terra úmida e objetos estranhos feitos de madeira da mata, erguiam um santuário no quintal sob o pé de manga e deixavam aos poucos tudo pronto para a chegada de suas crianças moldadas em barro. Era tudo imaginação, essa capacidade de fartura que o amor concede ao pensamento. A intimidade brotou depois da distância, de tão raros foi preciso que vivessem assim por um tempo, para preservar-lhes da intensidade de tudo que queriam, dessa condição do absurdo de não verem nada além um do outro e do risco de atropelarem as flores junto com as folhas secas.

Comentários

Postagens mais visitadas